“Hádron” é o nome genérico de partículas elementares que interagem pela força forte, como prótons e nêutrons (conjuntamente chamadas de nucleons, pois são as partículas que compõem núcleos atômicos). Hádrons dividem-se em dois tipos: bárions e mésons. Prótons e nêutrons são exemplos de bárions, enquanto o exemplo mais conhecido de méson é o píon ou méson pi.
H. Yukawa e C.M.G. Lattes em Princeton nos anos `50.
O méson pi foi introduzido pelo físico japonês H. Yukawa em 1935 como o campo responsável pela força nuclear entre nucleons, em analogia com o papel exercido pelos fótons na interação eletromagnética. Posteriormente, em 1947, o físico brasileiro C. M. G. Lattes conseguiu detectar pela primeira vez os mésons pi produzidos tanto por raios cósmicos, em um laboratório em Chacaltaya, como no acelerador Bevatron, em Berkeley1).
No início da década de 1950, aceleradores de partículas e detectores modernos abriram o caminho para a descoberta de várias espécies novas de partículas elementares, a grande maioria destas sendo hádrons. Hoje já conhecemos a existência de milhares de bárions e mésons e de novas cargas conservadas associadas às reações nucleares, tais como estranheza, charme, etc. (hoje tais cargas são chamadas de “sabores”). A existência de milhares de hádrons indica que estas partículas não parecem ser elementares, mas devem ser sistemas compostos de objetos mais fundamentais.
Hoje, sabemos que a teoria fundamental que descreve as interações fortes ou nucleares é a Cromodinâmica Quântica (QCD), que compõe um setor do Modelo Padrão de partículas elementares. Na QCD, os graus de liberdades fundamentais são chamados de quarks e glúons, nomes propostos2) originalmente por M. Gell-Mann na década de ’60. Quarks são férmions e glúons são bósons. Em uma analogia com a interação eletromagnética, quarks corresponderiam às partículas carregadas e glúons aos fótons. Mas, diferentemente do eletromagnetismo, existem três tipos de “cargas” relacionada à interação nuclear, chamadas de vermelho, verde e azul. Atualmente, foram detectados 6 tipos ou sabores de quarks: up, down, strange, charm, bottom e top. No contexto da QCD, os bárions são hádrons formados por três quarks de cores diferentes, de tal forma que a carga total de cor fique nula, como ilustrado na figura abaixo no caso de prótons e nêutrons.
Estrutura de núcleos
Os mésons, por outro lado, são compostos por um par de quark e anti-quark, de tal modo que a carga total de cor também fique nula.
Um dos aspectos surpreendentes da QCD é a existência de um mecanismo, chamado confinamento, o qual não permite a existência de seus próprios graus de liberdade básicos, os quarks e glúons, como estados livres. Ou seja, não existem quarks livres no mundo em que vivemos: os quarks e glúons somente podem existir confinados dentro de hádrons. Até hoje, nenhum quark livre jamais foi detectado e todas as evidências experimentais da existência destas partículas elementares são indiretas (apesar disso, são evidências muito concretas).
Outra propriedade ou previsão da QCD é a existência de uma fase da matéria deconfinada, na qual os graus de liberdade dos quarks e dos glúons se manifestam diretamente, como ilustrado na figura abaixo. Essa nova fase da matéria é chamada de plasma de quarks e glúons (QGP) e somente pode existir em situações de altas temperaturas e densidades. O nosso próprio Universo passou pela fase de QGP pelo menos alguns microssegundos depois do Big Bang. Estudar esta nova fase da matéria em aceleradores de partículas ou no interior de estrelas é um dos maiores desafios experimentais e teóricos da atualidade.
Com os aceleradores de partículas modernos, as condições necessárias para produzir o QGP são atingidas em colisões ultra-relativísticas de íons pesados, como as realizadas nos laboratórios de RHIC – Brookhaven e LHC-Genebra. Os programas de colisões de íons pesados foram e continuam sendo bem sucedidos, obtendo vários resultados que confirmam a existência de um estado da matéria no qual quarks e gluons não estão confinados em hádrons3).
Um outro senário, onde o estado da matéria atinge ao desconfinamento de quarks e gluons ocorre nas estrelas de nêutrons (veja também o link do Origem dos Elementos ). As estrelas de nêutrons são formadas numa explosão de supernova tipo II, onde o processo de colapso gravitacional do caroço de uma estrela gigante (mais de 10 vezes do sol) no estágio avançado compressiona a matéria no centro até os núcleos se fundem, formando uma estrela de nêutron e em troca, a energia de ligação gravitacional é liberada para explodir o resto da matéria fora. Abaixo, mostramos as imagens de duas nebulosas, como reminiscências de explosão de supernovas, com presença de estrelas de nêutrons nos centros.
Nebulosa Caranguejeira, a primeira supernova que tem registrada na terra em 1054. A existência de estrela de nêutron foi observada pela J.Bell em 1967.
Cassiopeia A (veja também NASA vídeo), mais recente observada na nossa Galáxia.
O estudo sobre a estrutura de estrela de nêutrons foi iniciado pelo Oppenheimer e Volkoff em 1939 e tem continuado acompanhando o desenvolvimento do conhecimento da propriedade da matéria nuclear4). Recentemente houve um salto do lado observacional de estrela de nêutrons, envolvendo a dinâmica delas. Em particular, as observações de processo de fusão de duas estrelas de nêutrons pela onda gravitacional, junto com a as observações de gamma ray burst (ver https://www.youtube.com/watch?v=e_uIOKfv710 ), abrindo um grande oportunidade para investigar as propriedades da matéria em condições extremas da densidade.